terça-feira, 28 de agosto de 2007

Massacre dos comandos negros 4ª e ultima parte

O presidente da Guiné durante esse período, Luís Cabral, a viver em Lisboa, diz: “Não houve atentados contra a integridade física desses militares, salvo os que, depois de desmobilizados, quiseram atacar o novo regime a partir da fronteira com o Senegal.” Sobre a ameaça, feita por Umbaru Djaló, de arrasar os homens que esperavam em frente da embaixada portuguesa, afirma: “Não tenho conhecimento disso. Como presidente, não abrangia as actividades de segurança.” E, sobre as centenas de fuzilamentos – não há números precisos, mas os comandos guineenses falam de mais de 500 – Luís Cabral assegura que foram casos pontuais e que a lei militar previa a pena de morte, por isso, nunca terão sido resultado de caprichos, de ressentimentos: “Louvo as actividades dos meus companheiros da Justiça Militar. Cumpriram a sua missão, de certeza, sem cometerem abusos nenhuns. Por causa disso não tivemos guerras civis como em Moçambique ou Angola. Os comandos portugueses cometeram crimes incalculáveis nas áreas que tínhamos libertado. Mataram mulheres grávidas e abriram-lhes a barriga para castigar as populações.”

Protagonista do primeiro golpe de Estado da Guiné independente, em 1980, Nino Vieira derrubou o governo, de que fazia parte, e o presidente Luís Cabral. Uma semana mais tarde, chamou jornalistas, diplomatas, fez uma presidência aberta pelas valas comuns. Justificou o golpe com os fuzilamentos, as prisões sem julgamento, a corrupção. Luís Cabral comenta: “Se ele sabia onde estavam era porque participava desses actos. Eu nunca tive conhecimento de valas comuns. O Nino precisava de inventar um pretexto porque traíu os objectivos da nossa luta. Para justificar uma traição, todas as mentiras são possíveis.”

Uma verdadeira história de guerra nunca é moral. [...] Se uma história parece moral, não acreditem nela. Se no final de uma história de guerra se sentirem animados ou sentirem que um pouco de rectidão foi preservada, então foram vítimas de uma velha e horrível mentira.
Tim O’Brien, combatente no Vietnam, escritor

Orlando Silva, um dos primeiros elementos da Companhia de Comandos Africanos, sentou-se com o filho, noite dentro, na sua cozinha de Massamá: “Ele, que anda na faculdade, perguntou-me: ‘Como consegues. Eu respondi que sou forte.” E ri-se.

Orlando Silva combateu durante sete anos: “Só pedia para que, se fosse apanhado numa mina, morresse logo.” Depois houve a independência e, como ordenavam as guias de marcha, entrou num quartel sem tropas portuguesas. Na casa de uma amiga, ouviu uma conversa entre rapazes: “Eles diziam que o PAIGC ia liquidar os comandos.” Entregou a mulher e os filhos ao sogro e fugiu para o Senegal, com a ajuda de um caçador. Ficou sem notícias da família. Trabalhou como pintor: “Se voltasse, limpavam-me.” Passados quatro anos, a mulher, que vendia aguardente, cansada que lhe dissessem na rua “Olha a mulher do comando”, pegou nos dois filhos, num fato do marido e atravessou a fronteira. Orlando recorda: “Um dia disseram-me: ‘A tua mulher está no Senegal.’ Procurei-a e, quando a vi, ajoelhei-me a chorar”. Três anos mais tarde, com a ajuda da Associação de Comandos, conseguiu vir para Lisboa, mas sozinho. Mais sete anos sem a família, que voltou para a Guiné.

Orlando conta episódios de soldados que fumaram o último cigarro enquanto cavavam valas comuns. Depois um tiro na cabeça. Pergunta: “Onde estava o governo de Portugal?” Olha para uma lista com os nomes de 138 fuzilados. Ri-se porque se lembra de todos, do melhor de cada um: “Zeca Lopes. Vim-me embora no dia do casamento dele. Disse-lhe para fugir. Ele respondeu: ‘Caso-me hoje e vou-me embora? Deixo cá a minha noiva’?”

O dedo de Orlando Silva desce na lista dos fuzilados. Outro nome, e outro sorriso, o inicio de outra história.

REVISTA ATLÂNTICO – JUNHO 2005 (4ª e ultima parte)

3 comentários:

Nero disse...

Pretos.
Cumprimentos.

Navegação disse...

Meu Caro Nero

É verdade são pretos mas lutaram em nome de Portugal, defenderam o território ultramarino em nome de uma grandiosa nação, tem todo o meu respeito. Quanto vale um homem destes ao pé de um Mário Lino ou de um José Sócrates?

Uma coisa eu lhes garanto, não fazem parte dos Gangs da Cova da Moura nem da Amadora, estes, viveram e lutaram por uma causa.

Anónimo disse...

Concordo com o navegação

Eles defenderam a nossa Pátria, ao contrario de muitos outros. Sou nacionalista, sou contra a imigração, mas após o 25 de abril de 1974, foi o que foi...