Massacre dos comandos negros 1ª parte
um dos comandos que sobreviveram
Em A Barreira Invisível, de Terrence Malick
Durante a guerra pisou uma mina. “Nem ouvi o barulho.” Havia trovões e chuva. O capim era alto. Uma emboscada. Os inimigos iniciaram os disparos após a explosão. “Tinha um buraco na minha perna. Via o osso. Rasguei o camuflado, apertei para não sair mais sangue. Continuei a fazer fogo. Fui evacuado uma hora depois.”
Na segunda vez que foi ferido, Sadjo Camara, nascido na Guiné, comando português, entrou no helicóptero e uma bala perfurou-lhe uma nádega.
Houve ainda um terceiro ferimento. “Era o comandante de grupo e, por isso, o primeiro a saltar do helicóptero – saltávamos de muito alto. Fui logo atingido.” Uma bala que lhe entrou de lado, acima da cintura, e que fugiu pelo outro. “Nem sabia onde estava. Lembro-me da enfermeira. Tiveram de coser-me as tripas.”
Depois, em 1974, acabou a guerra. Mas Sadjo Camara era tropa especial. Usara a boina dos comandos. Tinha recebido uma Cruz de Guerra pelo uso de uma bazuca, no dia em que o seu grupo, na mira do fogo inimigo, ficou preso no lodo de um rio. Um cabo e um furriel desapareceram na água.
Na lotaria da guerra de Sadjo, houve ainda o cabo Martins: “Estávamos a falar. Ele ao meu lado, a comer a ração de combate. Levou um tiro no pescoço e morreu.”
Os comandos, entre as tropas inimigas, eram vistos como fantasmas. Sadjo diz: “Eles tinham medo, diziam que não éramos pessoas, que éramos animais.” Por isso, depois da independência, num fim de tarde de 1975, quando as tropas portuguesas já tinham abandonado o território, militares do PAIGC – Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde – entraram em sua casa, disseram: “Você vai preso, você é comando, vai atacar o quartel-general.” Não vinham fardados. Queimaram-lhe as fotografias, levaram-lhe os galões, ataram-lhe as mãos atrás das costas. “Eu não tinha arma”, conta Sadjo. “Perguntei: Vou atacar com o quê? Com a boca?”
Esteve um ano e meio na cela de uma esquadra de polícia. Durante a visita de um membro do PAIGC, questionou: “Porque fui preso? Não sei.” O homem respondeu: “Eu também não sei.” Em seis anos, nunca foi acusado ou presente a tribunal.
Na parada de um quartel, transformado em prisão, para onde foi transferido, testemunhou o fuzilamento de um antigo comandante das milícias negras do exército português. “Ele tinha uma mulher, quatro filhas bonitas e quatro filhos machos. Estavam lá todos. Despediu-se da família, um a um. Os do PAIGC disseram: ‘Não podem chorar. Quem chora também vai’. Tínhamos de gritar ‘Viva’ e bater palmas.”
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